Lei 13.360/16 gera grande impacto no setor elétrico brasileiro

Por Urias Martiniano Neto

A Medida Provisória 735, de 22 de junho de 2016[1], trata da (a) Conta de Desenvolvimento Energético (CDE); (b) privatização das concessionárias de distribuição e o (c) repasse dos custos decorrentes do Tratado de Itaipu para os consumidores.

A referida medida provisória é fruto da alteração do Governo Federal, após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, o vice-presidente Michel Temer assumiu o comando do Poder Executivo e vislumbrou a necessidade de promover alterações no setor elétrico brasileiro.

Após o processo de conversão da Medida Provisória 735, de 22 de junho de 2016, em 18/11/2016, foi publicada a Lei 13.360, de 17 de novembro de 2016[2].

A seguir as principais alterações propostas pela Lei 13.360, de 17 de novembro de 2016:

Conta de Desenvolvimento Energético – CDE
A Conta de Desenvolvimento Energético exerce dois papéis no setor de energia elétrica, o primeiro com um fundo setorial fomentado pelos mais diversos agentes do mercado de energia, além do Governo Federal, destinado a subsidiar determinadas políticas do setor e o outro como um encargo cobrado dos consumidores e incorporado na Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD).

Com a publicação da Lei 13.360, de 17 de novembro de 2016, verificou-se alterações na Conta de Desenvolvimento Energético, com destaque para as seguintes mudanças:

i) transfere para a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) a gestão da Conta de Desenvolvimento Energético, anteriormente administrada pela Centrais Elétricas Brasileiras (Eletrobrás), bem como a gestão da Reserva Global de Reversão (RGR) e Conta de Consumo de Combustíveis (CCC).

ii) amplia as despesas da CDE para abarcar (b.1) a compensação dos descontos aplicados nas tarifas de uso dos sistemas elétricos de transmissão e (b.2) o impacto tarifário da reduzida densidade de carga do mercado de cooperativas de eletrificação rural, concessionárias ou permissionárias, em relação à principal concessionária de distribuição supridora.

iii) suporta os custos administrativos, financeiros e tributário da CCEE devido pela administração da CDE.

iv) limita a R$ 3,5 bilhões até o exercício de 2017, os custos dos reembolsos do pagamento das despesas com aquisição de combustível, incorridas até 30/4/2016 pelas concessionárias de distribuição que prestam serviço em Estados da Federação cujas capitais não estavam interligadas ao Sistema Interligado Nacional – SIN.

v) apresentação de plano estrutural de redução das despesas da CDE, até 31/12/2017.

vi) alteração dos prazos e forma rateio das quotas anuais da CDE.

vii) isenção do pagamento das quotas anuais da CDE, para Tarifa Social.

viii) a possibilidade de exploração do serviço público estadual de gás canalizado para os agentes autorizados de geração de energia elétrica.

ix) exclusão dos custos para compensar o efeito da não adesão à prorrogação de concessões de geração de energia elétrica.

Em que pese tenha ocorrido a revogação do inciso IV do artigo 13 da Lei 10.438/2002[3], o § 13, artigo 13 do mesmo dispositivo legal prevê que a CDE cobrirá as despesas assumidas relacionadas à amortização de operações financeiras vinculadas à indenização por ocasião da reversão das concessões e para atender à finalidade de modicidade tarifária, nas condições, nos valores e nos prazos em que essas obrigações foram atribuídas à CDE.

Inicialmente, observa-se que as alterações promovidas com a publicação da referida lei federal, não acarretarão em uma redução dos custos da CDE assumidos pelos consumidores.

Registra-se que, a atual metodologia da CDE possui explícita ilegalidades, mormente pois:

a) promoveu o deslocamento de custos nos ambientes de contratação (ACL e ACR), o que descumpre os preceitos legais da Lei nº 10.848/2004 e cria subsídios cruzados, sem previsão legal;

b) Transferiu os valores de políticas públicas (cuja obrigação é exclusiva do Governo Federal) para os consumidores; e

c) Desrespeitou o princípio da reserva legal, pois a alteração do encargo CDE não poderia ocorrer por meio de decreto, mas exclusivamente via lei ordinária, por respeito aos artigos 37 e 175 da Constituição Federal, sob pena de inconstitucionalidade da cobrança.

Tais ilegalidades, geraram o ajuizamento de diversas medidas judiciais e obtenção de decisões favoráveis, para (i) excluir algumas das parcelas que compõem a CDE da base de cálculo da TUSD, (ii) restituir os valores pagos a partir de fevereiro/2015 e (iii) afastar o impacto do rateio decorrente de decisões judiciais sobre a CDE.

Diante do exposto, conclui-se que as alterações promovidas com a publicação pela Lei 13.360/2016, além de não reduzirem os custos da CDE, não estancaram as ilegalidades cometidas pelo Poder Concedente e Agência Reguladora.

Consumidor Livre de Energia Elétrica
A Lei 13.360/2016 trouxe mudanças relevantes aos consumidores livres/especiais de energia elétrica, sem dúvida representa um marco ao setor elétrico brasileiro. Vejamos:

a) venda de excedente das distribuidoras: a previsão legal de que as concessionárias do serviço público de distribuição de energia elétrica poderão, conforme regulação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), negociar a venda de energia elétrica para os consumidores livres/especiais, quando houver excesso de energia contratada para atendimento à totalidade do mercado.

b) fim da restrição de tensão para os Consumidores Livres no ACL:  A partir de 1/1/2019, os consumidores que, em 7 de julho de 1995, consumirem carga igual ou superior a 3 MW e forem atendidos em tensão inferior a 69 kV poderão optar pela compra de energia elétrica a qualquer concessionário, permissionário ou autorizado de energia elétrica do sistema.

Sistema Isolado de Energia
O Sistema Isolado de Energia Elétrica é o sistema elétrico de serviço público de distribuição que, em sua configuração normal, não esteja eletricamente conectado ao Sistema Interligado Nacional (SIN), por razões técnicas ou econômicas.

A Lei 13.360/2016 prevê que as atividades de previsão de carga e planejamento da operação do Sistema Isolado serão executadas, mediante autorização do poder concedente, pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a partir de 1/5/2017.

Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos
A Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos (CFURH) é o pagamento pela exploração dos recursos hídricos na produção de energia elétrica.

Com a publicação da Lei 13.360/2016, a CFURH passa de 6,75% para 7% sobre o valor da energia elétrica produzida, a ser paga por titular de concessão ou autorização para exploração de potencial hidráulico aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios em cujos territórios se localizarem instalações destinadas à produção de energia elétrica, ou que tenham áreas invadidas por águas dos respectivos reservatórios, e a órgãos da administração direta da União.

Concessões de Geração de Energia Elétrica
A Lei 13.360/2016 estabelece algumas alterações na Lei 12.783/2013 que trada das concessões de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, com destaque para as seguintes mudanças:

a) vencido o prazo das concessões ou autorizações de geração hidroelétrica de potência igual ou inferior a 5 MW, será somente necessário o registro no âmbito da Anell;

b) alterações nos critérios para licitação e renovação de concessões de aproveitamento de potencial hidráulico maior que 5 MW e inferior ou igual a 50 MW.

c) alteração das potências para fim de concessão, autorização e registro, conforme artigo 6º da Lei 13.360/2016:

Concessão, mediante licitação:
i – o aproveitamento de potenciais hidráulicos e a implantação de usinas termoelétricas de potência superior a 50 MW destinados a execução de serviço público;

ii – o aproveitamento de potenciais hidráulicos de potência superior a 50 MW destinados a produção independente de energia elétrica;

iii – de UBP, o aproveitamento de potenciais hidráulicos de potência superior a 50 MW destinados a uso exclusivo de autoprodutor, resguardado direito adquirido relativo às concessões existentes.

Autorização
i – a implantação de usinas termoelétricas de potência superior a 5 MW destinadas a uso exclusivo do autoprodutor e a produção independente de energia;

ii – o aproveitamento de potenciais hidráulicos de potência superior a 5 MW e igual ou inferior a 50 MW destinados a uso exclusivo do autoprodutor e a produção independente de energia.

Registro
O aproveitamento de potenciais hidráulicos e a implantação de usinas termoelétricas de potência igual ou inferior a 5 MW estão dispensados de concessão, permissão ou autorização, devendo apenas ser comunicados ao poder concedente.

Programa Nacional de Desestatização
O Programa Nacional de Desestatização visa a venda de empresas, controladas diretas ou indiretamente, pela União.

A Lei 13.360/2016 alterou a Lei 9.491/1997 que versa sobre os procedimentos relativos ao Programa Nacional de Desestatização, prevendo a possibilidade de inversão da ordem das fases de habilitação e julgamento e estabelece que o pagamento para aquisição de bens e direitos no âmbito do Programa Nacional de Desestatização serão realizados por meio de moeda corrente.

Custos decorrentes do Tratado de Itaipu
A lei estabelece que o custo relativo ao encargo de cessão de energia da Usina Itaipu do Tratado Brasil-Paraguai será incorporado à tarifa de repasse da usina, sendo vedado o pagamento com recursos do orçamento geral da União.

A Lei 13.360/2016 prevê, ainda, que no caso de energia produzida acima da energia alocada a Itaipu pelo Mecanismo de Realocação de Energia (MRE), o custo acima será suportado pelos participantes do MRE.

Atraso de Operação Comercial
A Lei 13.360/2016 prevê que na ocorrência de atraso no início da operação comercial decorrente de circunstâncias caracterizadas pela Aneel como excludentes de responsabilidade, o prazo da outorga de geração ou transmissão de energia elétrica será recomposto, por meio da extensão da outorga pelo mesmo período do excludente de responsabilidade.

A lei estabelece, ainda, que os excludentes de responsabilidade são todas as ocorrências de caso fortuito e força maior, incluindo, mas não se limitando a, greves, suspensões judiciais, embargos por órgãos da administração pública direta ou indireta, não emissão de licenças ou autorizações pelos órgãos competentes por motivo não imputável ao empreendedor e invasões em áreas da obra, desde que reconhecidos pela Aneel a ausência de responsabilidade do agente e o nexo de causalidade entre a ocorrência e o atraso na entrada em operação comercial.

Mecanismo de Realocação de Energia
A Lei 13.360/2016 dispõe que os empreendimentos hidroelétricos não despachados centralizadamente que optarem por participar do MRE somente poderão ser excluídos do referido mecanismo por solicitação própria ou em caso de perda de outorga.

Alteração da Lei 9.427/1996
A Lei 13.360/2016 alterou dispositivos da Lei 9.491/1997, com destaque para ampliação de:

i) 500 GWh/ano para 700 GWh/ano para estabelecer as tarifas para o suprimento de energia elétrica realizado às concessionárias e às permissionárias de distribuição, inclusive às cooperativas de eletrificação rural enquadradas como permissionárias, bem como o procedimento para subvenção.

ii) 3 MW para 5 MW – os empreendimentos hidroelétricos com potência igual ou inferior a 5 MW terão percentual de redução não inferior a 50% a ser aplicado às tarifas de uso dos sistemas elétricos de transmissão e de distribuição.

Registra-se que, no caso de prorrogação de autorização para fonte solar, eólica, biomassa e cogeração qualificada, não haverá desconto nas tarifas de uso dos sistemas elétricos de transmissão e de distribuição.

Alteração da Lei 10.848/2004
A Lei 13.360/2016 também alterou a Lei 10.848/2004. Vejamos:

i) determina a previsão nas regras de comercialização da CCEE o pagamento de encargo para cobertura dos custos dos serviços do sistema, inclusive os serviços ancilares, prestados aos usuários do SIN, que compreenderão, entre outros custos definido na lei.

ii) alteração dos prazos para o início do fornecimento de energia elétrica fruto dos Contratos de Comercialização de Energia no Ambiente Regulado (CCEAR’s):

a.i.1 – Leilão de Energia Existente: mesmo ano ou até no quinto ano subsequente ao da licitação, com prazo de suprimento de no mínimo 1 e no máximo 15 anos.

a.i.2 – Leilão de Energia Nova: a partir do terceiro e até o sétimo ano subsequente ao da licitação, com prazo de suprimento de no mínimo 15 e no máximo 35 anos. (a participação no leilão está condicionada a não entrada em operação comercial do empreendimento).

Vetos – Lei 13.360/2016
O Presidente Michel Temer no gozo de suas atribuições, por meio da mensagem 613, de 17 de novembro de 2016[4], vetou alguns dispositivos da Lei 13.360/2016.

Tendo em vista, os vetos do presidente Michel Temer de alguns dispositivos da Lei 13.360/2016, caberá ao Congresso Nacional a apreciação desses vetos, em sessão conjunta, que poderá rejeitar os vetos do Presidente pelo voto da maioria absoluta dos deputados e senadores, conforme prevê o § 4º, artigo 66 da Constituição Federal[5].

Diante do exposto, considerando que o Governo Federal possui a maioria no Congresso Nacional, acredita-se na manutenção dos vetos propostos pelo Presidente Michel Temer.


1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Mpv/mpv735.htm

3 IV – prover recursos e permitir a amortização de operações financeiras vinculados à indenização por ocasião da reversão das concessões ou para atender à finalidade de modicidade tarifária;

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