Por Cid Tomanik, advogado especialista no mercado de óleo e gás e consultor de empresas na estruturação e negociação de contratos de fornecimento de gás natural
Algumas indústrias têm uma visão linear sobre o consumo de energia no processo fabril, pois entendem que se trata de um custo inevitável e que só pode ser gerenciado reduzindo seu uso. Por conta disso, ficam à espera de que o governo proponha medidas de redução do valor da tarifa do gás natural.
O core business das indústrias é o bem ou serviço produzido por elas. Assim, elas não têm know-how necessário para a aquisição do insumo energético utilizado no processo fabril. Isso é particularmente verdadeiro em indústrias de pequeno porte, nas quais a contratação de profissionais especializados na gestão de energia traria um custo maior para o processo.
Apesar disso, com a sofisticação do mercado, a gestão de energia ganhou uma importância até então não considerada pelas indústrias. Atualmente, quanto maior o porte, maior a preocupação em gerir a conta de energia de forma mais eficiente, que resulte em menores custos de produção.
Algumas indústrias possuem setores específicos destinados à energia em seus quadros. No entanto, grande parte delas prefere terceirizar algumas dessas atividades para consultorias especializadas em contratação de energia, que as auxiliam a lidar com uma atividade nas quais elas não são especialistas. Essas consultorias também as ajudam a administrar os contratos celebrados com os supridores de energia, os quais, de modo geral, têm conferido regras contratuais que o contratante não tem como arcar na vida do contrato. Como não são especialistas na aquisição de energia, as indústrias muitas vezes ficam reféns de contratos leoninos. O apoio de um profissional do setor de energia ajuda a indústria a contratar e também a gerir o contrato.
Alguns pontos importantes que muitas vezes as indústrias relevam:
• Desconhecimento do conceito de serviço de utilidade pública. A indústria não conhece todas as condições que integram os contratos de fornecimento de gás natural. O conteúdo dessas cláusulas não é habitualmente negociado entre as partes, o que faz com que esses contratos sejam conhecidos como contratos de adesão. Consequentemente, são atribuídas condições e decisões unilaterais, como a distribuidora poder substituir o gás por outra fonte energética ou interromper o fornecimento.
• Avaliação precisa da demanda a ser adquirida. A indústria sabe as quantidades produzidas no processo industrial, mas tem dificuldade em associar essa produção à necessidade de energia para o processo. Isso resulta em contratações de insumo em quantidade distinta da necessidade do cliente (em regra, o cliente contrata mais do que precisa).
• Avaliação das penalidades impostas pelo vendedor. Caso o cliente não consiga cumprir cláusulas contratuais, isso pode gerar comprometimento financeiro (por exemplo, cláusulas de take or pay). Por esse motivo, a definição das quantidades é muito importante, para evitar surpresas.
O preço da energia contratada também deve ser muito bem avaliado, sobretudo em relação a indexadores e períodos de reajustes. Deve-se tentar compatibilizar esses índices sempre com a maior aderência possível aos indicadores do processo fabril.
Outro ponto de suma importância é a necessidade de maior flexibilidade nos contratos, permitindo a migração entre combustíveis com maior facilidade. Atualmente, apenas as distribuidoras são beneficiadas. Os estados brasileiros detêm o monopólio dos serviços locais de distribuição de gás combustível na forma canalizada, mas o serviço não está restrito somente ao gás natural. Desse modo, cabe a cada concessionária buscar alternativas. Portanto, se não há disponibilidade de gás natural, a empresa está obrigada a buscar outra fonte energética.
Em suma, a “cultura do gás” é pouco desenvolvida entre os consumidores industriais, sobretudo no que tange a seus direitos, trazendo a necessidade de buscar apoio de profissionais do setor, visto que a gestão de energia é de fundamental importância para minimizar o custo de produção e, consequentemente, o custo Brasil.
Cid Tomanik é advogado especialista no mercado de óleo e gás e consultor de empresas na estruturação e negociação de contratos de fornecimento de gás natural